sexta-feira, dezembro 15, 2006

Recordações


Já cheira a Natal. As pessoas apressam-se nos preparos da ceia e na compra dos presentes. As lojas esperam os clientes e algumas até já fazem promoções.
Como eu gostava dos natais de antigamente! Tenho recordações dos meus natais da minha infância, do cheiro do musgo do presépio, das figurinhas de barro, dos doces feitos em casa, da missa do Galo à meia-noite, da família reunida à mesa para a ceia. Era escolhida a melhor toalha, os doces eram um segredo de família que iam passando de geração em geração.
Eram os natais dos tempos felizes com a minha mãe, que dois dias antes já andava na cozinha a preparar os doces que ela tão bem sabia fazer, a ceia, e tudo o mais para compor a mesa. Depois era a árvore de Natal, o Presépio e todos aqueles perfumes que só esta época festiva possui.
No dia seguinte, muito cedo, levantávamo-nos para ir a correr ver o que o Menino Jesus tinha deixado no sapatinho. Decerto os nossos pais, ao verem o brilho que tínhamos no olhar, quando abríamos os presentes, que supostamente tinham origem divina, davam por bem empregue o dinheiro que, com sacrifício, tinham gasto nas compras. Era tudo bem-vindo e a alegria era a mesma quer fosse uma boneca ou um simples caderno ou afia-lápis.
Mas, recordando estes episódios, parece que já se passaram cem anos. E que tudo isto aconteceu num tempo longínquo. Porque os Natais de hoje já são muito diferentes.
Há ainda muita gente que se desloca a muitos quilómetros para se juntar à família que vive longe. Mas outros tantos já preferem comprar na agência de viagens, os natais na neve ou numa qualquer estância tropical.
As crianças fazem longas listas de pedidos mesmo sem já acreditarem no Pai Natal ou no Menino Jesus. Perdeu-se a magia e o encantamento do dia seguinte na abertura dos presentes porque eles já sabem o que lá está. Negociaram antes com os pais, as Play Stations, o telemóvel ou o computador.
À mesa, onde agora há sobretudo comida comprada já feita, come-se à pressa para ir ver televisão, ou no caso dos filhos mais velhos, irem “dar uma volta” com os amigos porque não estão para ficar ali a ouvir as conversas dos mais velhos. É uma chatice para eles.
Então a moda agora é ver muita gente na rua na noite de Natal, e os bares estão abertos que é quando têm mais movimento.
Realmente perderam-se muitos valores, perdeu-se o espírito do Natal, que com o tempo vai sendo, apenas, um feriado comercial. O que importa é se as prendas já foram compradas. As lojas agradecem.
Era bom que todos os dias fossem Natais, sem ser preciso pretexto para dar. Mas, como isso parece impossível, que ao menos uma vez no ano se volte a incutir o espírito de união, partilha e solidariedade que a quadra encerra.
Este seria o melhor presente para a humanidade. E nem era preciso embrulhar.

Maria de Portugal

(Publicado na “Gazeta de Lagoa” em 08/12/2006)

1 comentário:

Anónimo disse...

Sbscrevo inteiramento o que escreves no teu texto!
Escrita lúcida, sensível e oportuna!
Parabéns, conheço-te há anos e desconhecia este teu talento.
Um bejo grande da carolina!
E...Bom Natal!!! (tenha lá ele o "estilo" que tiver!)