sábado, junho 19, 2010

Morreu José Saramago



"Entre os bacorinhos acabados de nascer aparecia de vez em quando um ou outro mais débil que inevitavelmente sofreria com o frio da noite, sobretudo se era Inverno, que poderia ser-lhe fatal. No entanto, que eu saiba, nenhum desses animais morreu. Todas as noites, meu avô e minha avó iam buscar às pocilgas os três ou quatro bácoros mais fracos, limpavam- lhes as patas e deitavam- nos na sua própria cama. Aí dormiriam juntos, as mesmas mantas e os mesmos lençóis que cobririam os humanos cobririam também os animais, a minha avó num lado da cama, o meu avô no outro, e, entre eles, três ou quatro bacorinhos que certamente julgariam estar no reino dos céus..."

(Do livro « As Pequenas Memórias», José Saramago, falando de seu avô Jerónimo e de sua avó Josefa )
Publicou Carolina

2 comentários:

Jelicopedres disse...

[...]
Tu estavas só, avó, sentada na soleira da tua porta aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabias e por onde nunca viajarias, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e disseste, com a serenidade dos teus noventa anos e o fogo de uma adolescência nunca perdida: « O mundo é tão bonito e eu tenho tanta pena de morrer.»
[...]

José Saramago/As Pequenas Memórias

lami disse...

A morte, nos escritos de Saramago, é um tema recorrente e apesar do seu "ateísmo militante" descobre-se uma procura frequente de Deus, do Céu ou de um estádio superior, acima dos Homens... quem sabe se ele não O terá por fim encontrado :)