(A "Árvore da Vida" de Klimt)
UMA LONGA AMIZADE
Zé das Caliças irritado, afasta com a mão nodosa de artrite, a mosca que teimosamente insiste em pesquisar a sua pele rugosa e cansada.
- Então não querem lá ver esta safada! Levas uma cachaporrada!
Manel do Paço olha na direcção onde julga estar a mosca sem vida, nada vê, mas também não é muito importante esforçar as vistas por causa de uma mosca morta. Prefere orientá-las para o recinto do jardim, onde a azáfama é enorme na preparação das festas da aldeia. O silêncio instalou-se entre os dois amigos, cada um envolvido nos seus próprios pensamentos e recordações.
Nisto, vindo do nada, surge o Malhadinhas, de rabo hirto distribuindo marradinhas às pernas dos dois amigos ainda pensativos.
Os dois velhotes e o bichano envolvem-se em vínculos fluidos de afectos, como colectâneas vivas de prazeres e alegrias. O gato deixa-se invadir por uma lassidão profunda, distribuindo “rons-rons” ritmados. De olhos semi-cerrados é envolvido por uma modorra de prazer e paz, enquanto é afagado carinhosamente pelos seus dois amigos.
Os dois homens olham-se e sorriem. Foi o Manel do Paço que interrompeu o silencio.
- Ó Caliças. já viste este safado? Cada vez está mais meloso, acho que ele anda de Janeiro!
-Talvez, talvez. Ó Manel tu ainda te lembras quando foi Janeiro?!
-Olha, olha, então achas que eu sou esquecido como tu?!
Os dois amigos riem-se das suas próprias brejeirices tardias e, vão nos seus passinhos cansados até ao jardim onde os preparativos para a festa, estão já nos finais. Encontram pessoas conhecidas e forasteiros veraneantes, em procura de muita animação e divertimento constante. Em tempos, também eles se divertiam até ao amanhecer de um novo dia, agora, o cansaço dos anos obriga a ter contenção e, lá vão eles em passos curtos até para as suas respectivas casas, tranquilos e serenos como sempre.
Zjesus (Zília)
21-08-2007
Publicou carolina